Suposto esquema envolvendo cestas básicas teria causado prejuízo de R$ 73 milhões. Governador afirmou que recebe a decisão com respeito às instituições, mas se trata de uma ‘medida precipitada’
O governador Wanderlei Barbosa (Republicanos), afastado nesta quarta-feira (3/9) por 180 dias por suspeita de envolvimento com desvio de recursos da compra de cestas básicas, está no cargo desde 2021. Ele assumiu o governo após o então governador Mauro Carlesse (Agir) ter sido afastado e renunciar ao mandato para evitar um processo de impeachment. Segundo a decisão, são apurados os crimes de frustração ao caráter competitivo de licitação, peculato, corrupção passiva, lavagem de capitais e formação de organização criminosa. O governador afirmou, em nota, que recebe a decisão com respeito às instituições, mas se trata de uma “medida precipitada” (veja nota completa abaixo). Em 2022, durante campanha, Wanderlei se apresentou como um homem do povo: “o governador curraleiro!”. O apelido usado insistentemente nas propagandas eleitorais tinha objetivo: não permitir que ninguém esquecesse as origens e a história da vida dele. Wanderlei Barbosa Castro é natural de Porto Nacional (TO). Ele começou a carreira política em 1989, quando se elegeu vereador pelo município. Em 1996 migrou para a capital e se elegeu vereador por Palmas, cargo que ocupou por vários mandatos sucessivos até 2010, chegando a presidir a Câmara Municipal ao longo de quatro anos. Em 2010 se elegeu para o primeiro de dois mandatos como deputado estadual, e permaneceu nesta função até 2018, quando se afastou para disputar a eleição suplementar ao lado de Mauro Carlesse como vice-governador na chapa que acabou vencedora. Carlesse foi afastado do cargo em outubro de 2021, em apuração sobre suposto pagamento de propina e obstrução de investigações. Wanderlei assumiu como governador e foi eleito novamente para o cargo em 2022. Com o afastamento de Wanderlei, quem assume o governo do Estado é o vice, Laurez Moreira (PSD), com quem Wanderlei não mantém um bom relacionamento. Em 2024, Wanderlei inclusive enviou proposta de emenda à constituição para evitar que o vice tomasse posse durante viagens do governador. O texto, chamado de PEC do Apego, foi aprovado no mesmo ano.
Afastamento por suspeita de corrupção
O afastamento do governador Wanderlei Barbosa e da primeira-dama, Karynne Sotero, do cargo de secretária, foi determinado pelo ministro Mauro Campbell Marques, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a pedido do Ministério Público Federal. Esta é a 2ª fase da Operação Fames-19, que busca reunir novos elementos sobre o uso de emendas parlamentares e o recebimento de vantagens indevidas por agentes públicos e políticos com a compra de cestas básicas durante a pandemia de Covid-19. Nesta quarta-feira (3/9) mais de 200 policiais estão cumprindo 51 mandados de busca e apreensão e outras medidas cautelares em Palmas (TO), Araguaína (TO), Distrito Federal, Paraíba, Maranhão.
A primeira-dama afirmou que também respeita a decisão e vai se dedicar à defesa para comprovar sua “total ausência de participação nos fatos”.
Foto: Reprodução/Instagram Wanderlei Barbosa

Primeira dama Karynne Sotero e o governador, Wanderlei Barbosa, foram afastados
Também afirmou que deseja que tudo seja esclarecido . O g1 entrou em contato com o Palácio Araguaia onde estão sendo cumpridos mandados, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem. O g1 também pediu posicionamento para a defesa de Mauro Carlesse, governador anterior, mas não houve resposta até a última atualização desta reportagem. A Assembleia Legislativa do Tocantins (Aleto) informou que prestou colaboração total e irrestrita no cumprimento integral das determinações contidas em dez mandados de busca e apreensão, disponibilizando todos os equipamentos, documentos e informações solicitados. Também informou que não foi intimada de nenhuma decisão judicial relacionada ao caso, que ainda está em curso. Conforme a PF, as investigações, que tramitam sob sigilo no Superior Tribunal de Justiça, apontam fortes indícios de um esquema de desvio de recursos públicos entre os anos de 2020 e 2021. Nesse período, os investigados teriam se aproveitado do estado de emergência em saúde pública e assistência social para fraudar contratos de fornecimento de cestas básicas. Segundo a apuração, foram pagos mais de R$ 97 milhões em contratos para fornecimento de cestas básicas e frangos congelados. O prejuízo aos cofres públicos é estimado em mais de R$ 73 milhões. Segundo a investigação, os valores desviados teriam sido ocultados por meio da construção de empreendimentos de luxo, compra de gado e pagamento de despesas pessoais dos envolvidos. A operação foi chamada de Fames-19 em referência à insegurança alimentar ocasionada pela pandemia de Covid-19. Fames, significa “fome” em latim e “19” faz alusão ao ano em que a doença foi descoberta. Em agosto de 2024, Wanderlei Barbosa e a esposa Karynne Sotero, secretária extraordinária de Participações Sociais, foram alvos de busca na primeira fase da Operação Fames-19. Nessa fase, políticos e empresários estavam entre os alvos. Durante o cumprimento das buscas na casa e no gabinete de Wanderlei, os policiais federais encontraram R$ 67,7 mil em espécie, além quantias em dólares e euros.
Íntegra da nota do governador Wanderlei Barbosa
Recebo a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) com respeito às instituições, mas registro que se trata de medida precipitada, adotada quando as apurações da Operação Fames-19 ainda estão em andamento, sem conclusão definitiva sobre qualquer responsabilidade da minha parte. É importante ressaltar que o pagamento das cestas básicas, objeto da investigação, ocorreu entre 2020 e 2021, ainda na gestão anterior, quando eu exercia o cargo de vice-governador e não era ordenador de despesa. Reforço que, por minha determinação, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e a Controladoria-Geral do Estado (CGE) instauraram auditoria sobre os contratos mencionados e encaminharam integralmente as informações às autoridades competentes. lém dessa providência já em curso, acionarei os meios jurídicos necessários para reassumir o cargo de Governador do Tocantins, comprovar a legalidade dos meus atos e enfrentar essa injustiça, assegurando a estabilidade do Estado e a continuidade dos serviços à população.
Íntegra da nota de Karynne Sotero Campos
Reitero meu respeito à decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e às instituições, ressaltando que irei dedicar-me plenamente à minha defesa, convicta de que conseguirei comprovar minha total ausência de participação nos fatos que estão sendo apontados. Desejo que tudo seja esclarecido e reestabelecido com brevidade e justiça, pelo bem do povo tocantinense, a quem dedico meu trabalho e compromisso.
Íntegra da nota da Aleto
A Assembleia Legislativa do Estado do Tocantins (Aleto) informa que prestou nesta quarta-feira, 3, colaboração total e irrestrita ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e à Polícia Federal (PF), no cumprimento integral das determinações contidas em dez mandados de busca e apreensão, com a devida disponibilização de todos os equipamentos, documentos e informações solicitados. Informa ainda que a Procuradoria Geral da Casa não teve acesso aos autos, portanto, desconhece-se o que motivou a expedição dos referidos mandados. Além disso, a Aleto não foi intimada de nenhuma decisão judicial relacionada ao caso, que ainda está em curso. Os mandados de busca e apreensão aos quais a Aleto teve acesso foram direcionados aos gabinetes parlamentares dos deputados Amélio Cayres, Claudia Lelis, Cleiton Cardoso, Ivory de Lira, Jorge Frederico, Léo Barbosa, Nilton Franco, Olyntho Neto, Valdemar Júnior e Vilmar de Oliveira.